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22 fevereiro, 2013

Poema da despedida

Bill Domonkos Black And White animated GIF

Não saberei nunca
dizer adeus

Afinal,
só os mortos sabem morrer

Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos

Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo


Mia Couto

04 fevereiro, 2013

Pergunta-me



Lá longe... Por Claudia Félix. Imbé. RS.
Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue

Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos

Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente

Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer


Mia Couto


05 novembro, 2012

Tristeza









A minha tristeza
não é a do lavrador sem terra.
A minha tristeza
é a do astrônomo cego.


Mia Couto

,,,

No último mês algo mudou drasticamente em minha vida: índios! Redescobri no Brasil o genocídio que continua acontecendo desde a chegada dos portugueses. No interior de todo lugar da américa gritam vozes ancestrais. E descobrimos como somos ainda tão surdos, tão cegos, tão mudos, ...    

23 dezembro, 2009

Fui sabendo de mim


Fui sabendo de mim
por aquilo que perdia

pedaços que saíram de mim
com o mistério de serem poucos
e valerem só quando os perdia

fui ficando por umbrais
aquém do passo
que nunca ousei

eu vi a árvore morta
e soube que mentia


Mia Couto

Foto: Esquecimento. Campeche. Florianópolis.

07 novembro, 2009

Destino

à ternura pouca
me vou acostumando
enquanto me adio
servente de danos e enganos

vou perdendo morada
na súbita lentidão
de um destino
que me vai sendo escasso

conheço a minha morte
seu lugar esquivo
seu acontecer disperso

agora que mais
me poderei vencer?



Mia Couto


Foto: Longe, muito longe. Cacupé. Florianópolis.

05 novembro, 2009





(a aranha ateia
diz ao aranho na teia:
o nosso amor
está por um fio!)




Mia Couto

Foto: Das coisas leves. Freeway. RS.

Lhe cansavam, sim, as coisas sem alma. Ao menos a árvore, dizia ele, tem alma eterna: a própria terra. A gente toca o tronco e sente o sangue da terra circulando em nossas íntimas veias. E ficou. Parado, murchas as pálpebras.


Mia Couto


* um presente delicado de Simone

27 agosto, 2009

Identidade


Preciso ser um outro
para ser eu mesmo

Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta

Sou pólen sem insecto

Sou areia sustentando
o sexo das árvores

Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro

No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço



Mia Couto
Foto: Das flores improváveis. Gramado. RS.

18 agosto, 2009

Para Ti

Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo

Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que talhei
o sabor do sempre

Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só
amando de uma só vida


Mia Couto
Foto: Primeiro encontro. Campeche. Florianópolis.

patiodotempo.blogspot.com

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"e o mundo é meu, o mundo é seu, de todo mundo..." Zeca Baleiro